quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

05 a 12 de Dezembro - Unifilme debate a canção

Em programação paralela ao Projeto Unimúsica, uma mostra de documentários sobre a canção popular brasileira encerra as atividades do Programa Unicultura e do Núcleo de Estudos da Canção em 2008. A mostra acontece entre os dias 05 e 12 de dezembro, na Sala Redenção, cinema universitário da UFRGS. Algumas das sessões serão comentadas por participantes do Núcleo de Estudos da Canção da UFRGS. O Núcleo, criado em julho deste ano, tem encontros mensais, com a coordenação do professor Luís Augusto Fischer.

O evento tem entrada franca.
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Brasileirinho
MIKA KAURISMÄKI, Cor, 35mm, 90 min, 2005
Com Paulo Moura, Guinga, Yamandu Costa, Zé da Velha, Silvério Pontes e Joel do Bandolim.

No final do século XIX, no Rio de Janeiro, os músicos pararam de compor e tocar no estilo europeu para misturar melodias européias com ritmos africanos, gerando o choro. Aos poucos o gênero ganhou espaço nos salões de dança e nos palcos de teatro, sendo considerado a primeira expressão musical da emergente classe média da cidade.

05 de dezembro - 19h - Sessão comentada por Luciano Zanatta
10 de dezembro - 13h e 19h

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Cartola - Música para os olhos
LÍRIO FERREIRA, HÍLTON LACERDA, Cor, 88 min, 2007

A história de um dos compositores mais importantes da música brasileira. A história do samba a partir de um dos seus expoentes mais nobres. Utilizando linguagem fragmentada, CARTOLA traça um painel da formação cultural do Brasil, convidando a uma reflexão na construção da memória deste país.

08 e 11 de dezembro - 13h
08 de dezembro - 19h - Sessão comentada por Guto Leite
11 de dezembro - 19h - Sessão comentada por Alessandra Prates

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Maria Bethânia - Pedrinha de Aruanda
ANDRUCHA WADDINGTON, Cor, 16mm, 60 min, 2006
Com Maria Bethânia, Caetano Veloso, Dona Canô, Jaime Alem

Um documentário intimista sobre a cantora Maria Bethânia. Ela é vista nos bastidores de um show, seguindo seus rituais religiosos para entrada em cena, em conversas com seus parentes, como o irmão Caetano Veloso e a mãe, dona Canô, cantando em família e explorando caminhos secretos de sua infância em sua cidade natal, Santo Amaro da Purificação, no estado da Bahia.

09 e 12 de dezembro - 13h e 19h

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

02 de Dezembro: A Poesia e a Canção

O último encontro do Núcleo da Canção terá a cantora lírica Luciana Kiefer apresentando o estudo da canção de câmara brasileira, tema que será abordado a partir da análise da relação entre Música e Poesia. Fazem parte do estudo as seguintes questões: como os compositores eruditos lidam com estas duas linguagens; os tipos de relações possíveis ou a importância da poesia na canção; a posição do piano em relação ao canto e, consequentemente, ao texto poético; sistemas de análise das duas artes em separado, visando fornecer subsidios para a compreensão da interação das mesmas em uma canção.

Luciana Kiefer é professora substituta de canto do Instituto de Artes da UFRGS. Graduada em Arquitetura e Urbanismo, obteve o título de Mestre em Música/Canto pela UNESP, com ênfase no estudo da Canção de Câmara Brasileira. Fez especialização em Performance/Canto e Bacharelado em Canto na EMBAP (Curitiba). Estudou violino e integrou diversos corais e orquestras, tendo iniciado sua formação musical no Projeto Prelúdio.

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Terça-feira, 02 de dezembro, às 18h30.

Plenarinho da Reitoria - Campus Central da UFRGS

Entrada franca

terça-feira, 14 de outubro de 2008

11 de Novembro: Vitor Ramil em perspectiva

As Neo-Europas e a Estética do Frio

No quinto encontro do Núcleo de Estudos da Canção, o doutorando em Literatura Brasileira Ian Alexander apresentará o trabalho As Neo-Europas e a Estética do Frio. O estudo se baseia numa leitura do ensaio A Estética do Frio de Vitor Ramil, comparando a relação entre o Rio Grande do Sul e o Brasil com aquela entre a Austrália e o mundo britânico, e comparando a carreira de Ramil com aquela do australiano David McComb e da sua banda, The Triffids. A parte mais especificamente musical analisa aspectos dos discos Ramilonga, de Ramil, e In the Pines, de The Triffids.

Ian Alexander é australiano, mora em Porto Alegre desde 1998 e faz o doutorado em Literatura Brasileira na UFRGS, orientado pelo professor Luís Augusto Fischer. Sua tese também trata de uma comparação entre a produção cultural dos mundos latino e anglófono. Vinte anos atrás, Ian tocava bateria numa banda chamada One Over Zero, em Sydney.

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11 de Novembro, terça-feira, às 18h30

Plenarinho da Reitoria, Campus Central da Universidade

Encontro aberto ao público

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

07 de Outubro - O que são canções essenciais?

No próximo encontro do Núcleo de Estudos da Canção, Marcos Sosa abordará com senso crítico as já tradicionais listas de canções essenciais publicadas em revistas da área cultural, como Bravo! e Rolling Stone.

Marcos Sosa é professor, formado em Letras pela UFRGS, e em Teoria Musical pela Escola de Música da OSPA. Com a monografia intitulada Ramilonga - estudo da canção, sob orientação de Luís Augusto Fischer, iniciou em 2004 pesquisa na área da canção popular.

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Terça-feira, 07 de Outubro, às 18h30.

Plenarinho da Reitoria, Campus central da UFRGS. Av. Paulo Gama, 110.

Informações: 3308-3034 ou pelo e-mail unimusica@ufrgs.br

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Lista é lista, canção é canção - por Marcos Sosa

Arte não é competição das Olimpíadas, e canção popular não é corrida da Fórmula 1. Inevitável, no entanto, que neste momento dos 50 anos da bossa nova não surjam as tão atraentes e contestadas listas dos melhores, em forma de ranking, em revistas especializadas. Dois exemplos são a Rolling Stone Brasil ("100 maiores discos da música brasileira", outubro/2007) e a Bravo! ("100 canções essenciais da MPB", maio/2008). Claro que em ambas encontra-se o mea-culpa editorial esperado na introdução, pois lista é lista, critério é critério, e canção é canção. Disso os especialistas têm a obrigação de saber, e de enunciar ao leitor mais ingênuo do tipo que não relativizasse a questão.

Já no caso do ouvinte regular da canção, mais aparelhado para o tema, as publicações servem como comparativo entre si e com a "lista interna" que tenha elaborado intuitivamente. Servem também para uma espécie de leitura crítica sobre a atividade crítica, de modo a situá-la como gosto e aprendizagem do gosto (e toma-se aqui como positiva a idéia de que ouvir música é uma arte que se tem e/ou se aprende, e neste quadro um pouco de comentário não faz mal a ninguém).

Avaliadas de um modo geral, a seleção da Bravo! ("MPB") tem na bossa nova e na tropicália o eixo central, enquanto a da Rolling Stone ("música brasileira") adota uma variedade estilística maior, cabendo nela um pouco mais do rock, por exemplo. Uma e outra diferem pela semântica daquilo que seja tomado como popular, mas os compositores, intérpretes e obras evocadas pertencem a uma zona comum.

Apesar, porém, de uma quase homogeneidade, Jorge Ben Jor é uma ausência de primeiro nível na Bravo!, enquanto na Rolling Stone abraça um confortável sexto lugar com o álbum A tábua de esmeralda (Philips/Phonogran, 1972). Em vista de sua obra vasta e de seu lugar de consagrada contribuição à música (popular) brasileira, é possível dizer que o mea-culpa referido na introdução da Bravo! não convence como deveria. O modo de cantar de Jorge Ben é de dicção singular, fundante, e a clássicas como Os alquimistas estão chegando, Errare humanum est, ou tantas outras, deveria ter sido dada passagem. É com o universo místico ou malandro, futebolístico ou atrevido de Jorge Ben que a melodia brasileira aprendeu a servir ao extremo à letra, à fala mesma, adquirindo uma "elasticidade" admirável, conforme analisa Luiz Tatit em seu estudo intitulado O cancionista: composição de canções no Brasil (Edusp, 1996). Por estas e outras virtudes particulares, trata-se de um artista que trabalha a brasilidade com raro talento e alcance.

Claro que estas considerações não desfazem a grande utilidade dos excelentes comentários das duas revistas, nem o impagável conjunto de informações técnicas e de imagens. Assim como no caso apontado, as ausências serão tantas quantas o juízo de cada ouvinte dedicado souber perceber.

www.marcossosa.pro.br
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Próximo encontro:

Lista é lista, canção é canção - Marcos Sosa

07 de Outubro, terça-feira, às 18h30
Plenarinho, Campus Central da UFRGS

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Composições de Felipe Azevedo no próximo encontro


O próximo encontro do Núcleo de Estudos da Canção terá a primeira audição comentada de um trabalho autoral. A idéia é ouvir e debater o álbum Percussìvé ou a prece do louva-a-deus, de Felipe Azevedo. Abaixo, as canções escolhidas para guiar o encontro do dia 09 de Setembro:


1.Tema para um compasso de espera -
Letra e Música- Felipe Azevedo
Violão- Felipe Azevedo
Voz - Monica Salmaso
Gênero: Modinha

2. Maracatu Torto -
Letra: Mauro Aguiar e Música: Felipe Azevedo
Violão com voz - Felipe Azevedo.
Gênero: Maracatu

3. Percussìvé - Versão 1
Letra e Música: Felipe Azevedo
Violão com voz - Felipe Azevedo
Cello- Monica Limma
Flauta- Daniel Zanotelli
Gênero: Maculelê

4. Percussìvé - Versão 2 (Instrumental)
Arranjo e regência: Marcelo Nadruz
Execução: Violão Solista - Felipe Azevedo
Acompanhamento - Banda Municipal


quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Eu vou pra Maracangalha - por Salvatore Santagada


Eu saí da Itália, rumo à cidade de Porto Alegre, com quase seis anos, em dezembro de 1956, acompanhado de meu tio Giacinto, minha mãe Ida Maria e de minha irmã Valéria, de dois anos, para nos juntarmos ao meu pai, Luigi, que viera da Calábria no ano anterior. Chegando na rua São Joaquim, no bairro Glória, onde estava localizado o Açougue Internacional, lugar onde iria residir, ao lado do Armazém Flôr da Zona, ouvi pela primeira vez a música "Maracangalha" pelo rádio do armazém. A canção "Maracangalha" representava e ainda continua representando uma forma jovial, leve e radiante de ser do brasileiro. Isso foi marcante no deslumbramento sempre renovado do menino, que gostava de cantar as cançonetas napolitanas, sobre o País que lhe acolheu. Foi um acontecimento inesquecível, pois, até hoje, essa música está impregnada no meu "sangue brasileiro". Em 2004, na presidência do Sindicato dos Sociólogos do RS, propus a Diretoria comemorar no dia 30 de abril, com uma roda de samba, o nascimento do compositor Dorival Caymmi, o que vem sendo realizado todos os anos. Luto a cada dia para que a "utopia" de "Maracangalha" faça parte de todos os lares nacionais. O País que abriu suas portas aos estrangeiros, deve ser capaz de construir nos trópicos a felicidade e a cidadania para toda sua gente, e fazer acontecer nas palavras do poeta franco-suiço Blaise Cendrars, que identificava o novo país com a "Utopialand" (Terra da Utopia), e entusiasmado afirmava: "O Brasil, onde o simples fato de existir é uma felicidade".
"Eu vou pra Maracangalha, eu vou
Eu vou de 'liforme branco', eu vou
Eu vou de chapéu de palha, eu vou
Eu vou convidar Anália, eu vou"


Dorival Caymmi morre aos 94 anos no Rio
Por Cristiane Ribeiro


RIO DE JANEIRO (Agência Brasil), 16 de agosto - O compositor e cantor baiano Dorival Caymmi morreu neste sábado, no Rio de Janeiro, aos 94 anos. Dorival se tratava de um câncer na bexiga há onze anos e morreu de insuficiência renal por volta das 6h, em sua casa, em Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro.

Em 60 anos de carreira, Caymmi compõs sobre os hábitos, costumes e tradições do povo baiano. Em suas canções demonstrava sua adoração pelo mar e pela natureza. Ele gravou mais de 20 discos.

O filho, Danilo Caymmi, deu à Rádio Nacional do Rio de Janeiro a primeira entrevista sobre a morte do pai, no programa da radialista Dayse Lucidi. Segundo ele, a família "tem uma gratidão muito grande à Rádio Nacional, porque foi num show de calouros da emissora que Dorival Caymmi conheceu a mulher e companheira de toda a vida".

Segundo Danilo, a mãe, Stela Maris, está internada há três meses, em coma. "A família atravessa um momento muito difícil, mas não poderia deixar de falar à Rádio Nacional, em primeira mão, sobre o falecimento de meu pai. Ele morreu tranquilamente, baianamente, como ele dizia", disse Danilo.

Ainda de acordo com Danilo Caymmi, o horário e local do velório e sepultamento ainda não foram decididos. Ele disse que vai aguardar a chegada do irmão, Dori Caymmi, que mora no exterior, e que ainda não havia conversado com a irmã Nana Caymmi.

Entre as composições de Dorival Caymmi, as mais marcantes são "A Lenda do Abaeté", "Promessa de Pescador", "É Doce Morrer no Mar", "Marina", "Não Tem Solução", "Maracangalha", "Saudade de Itapoã", "Samba da Minha Terra", "Dora", "Rosa Morena" e "Eu Não Tenho Onde Morar".



Buda Nagô - Gilberto Gil

Dorival é ím-par
Dorival é par
Dorival é ter-ra
Dorival é mar
Dorival tá no pé
Dorival tá na mão
Dorival tá no céu
Dorival tá no chão
Dorival é be-lo
Dorival é bom
Dorival é tu-do
Que estiver no tom
Dorival vai can-tar
Dorival em C-D
Dorival vai sam-bar
Dorival na T-V
Dorival é um Buda nagô
Filho da casa re-al da inspiração
Como príncipe, principiou
A nova idade de ouro da canção
Mas um dia Xan-gô
Deu-lhe a i-lumina-ção
Lá na beira do mar (foi?)
Na praia de Arma-ção (foi não)
Lá no Jardim de A-lá (foi?)
Lá no alto ser-tão (foi não)
Lá na mesa de um bar (foi?)
Dentro do cora-ção
Dorival é E - va
Dorival Adão
Dorival é li-ma
Dorival é limão
Dorival é mãe
Dorival é pai
Dorival é o pe-ão
Balança, mas não cai
Dorival é um monge chinês
Nascido na Roma negra, Salvador
Se é que ele fez for-tuna, ele a fez
Apostando tudo na carta do amor
Ases, damas e reis
Ele teve e pas-sou (iaiá)
Teve o mundo aos seus pés (ioiô)
Ele viu, nem li-gou (iaiá)
Seguidores fi-éis (ioiô)
E ele se adian-tou (iaiá)
Só levou seus pin-céis (ioiô)
A viola e uma flor
Dorival é ín-dio
Desse que anda nu
Que bebe gara-pa
Que come beiju
Dorival no Ja-pão
Dorival samu-rai
Dorival é a na-ção
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Aos amigos do Núcleo da Canção, uma singela homenagem pela perda do Dorival que é mãe, pai e buda Nagô. "Dorival é a na-ção" brasileira.
Abraço,
Salvatore Santagada

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

A música na palavra - por Leandro Maia

A música na Palavra

Sabemos que não basta escrever poesia para se fazer uma canção, tampouco basta formação musical e compor melodias. A formação dos cancionistas é feita, na maioria dos casos, de maneira espontânea e imprevisível, já que cada um tem seu "jeito" de compor. Esse "jeito" liga-se, muitas vezes, a práticas milenares de criar - ou fazer surgirem - as canções. Criar uma boa canção envolve algo mais.

Luiz Tatit, em O Cancionista, declara que o compositor de canções atua como um "malabarista" que equilibra melodia no texto e texto na melodia.[1] Seu malabarismo se dá através da manipulação do tripé duração (ritmo, andamento, velocidade), freqüência (altura, entoação) e timbre vocal. Quando em ritmo acelerado, a melodia tenderia a se desenvolver menos; quando a freqüência for o parâmetro musical predominante de uma composição, o ritmo tenderá a se desacelerar.

Tatit dá o nome tematização para o primeiro processo (aceleração) e de passionalização ao segundo (desaceleração). Tais elementos são complementares e se alternam no decorrer das obras: as canções temáticas são em geral permeadas pelo sentimento de plenitude, de aproximação do sujeito com o objeto desejado; as canções passionais denotam o sentimento de ausência, onde o sujeito evidencia a falta do objeto de desejo. A presença do sujeito de desejo é evidenciada, além disso, pelo timbre vocal - que é a voz em todos os seus desdobramentos, desde as características vocais propriamente ditas até a utilização de uma entoação ou impostação mais coloquial, por exemplo.

A partir da leitura da dissertação Araçá Azul: uma leitura semiótica, de Pieter Dietrich - orientado por Luiz Tatit, pudemos constatar sobre o Modelo de Tatit[2] o seguinte esquema:


TEMATIZAÇÃO
· Aceleração
· Descontinuidade
· Foco nas Durações
· Concentração
· Involução
· Repetição de notas/graus conjuntos
· Memória/Repetição

PASSIONALIZAÇÃO

· Desaceleração
· Continuidade
· Foco nas Alturas
· Extensão
· Evolução
· Saltos intervalares/tessitura mais ampla
· Surpresa/Informação

Estas seriam grandezas, por assim dizer, inversamente proporcionais, mas não excludentes, pois podem aparecer de forma combinada - ou alternada - numa mesma canção. Em Garota de Ipanema (Tom Jobim/Vinícius de Morais) podemos claramente perceber a transição da tematização - primeira parte - para a passionalização - segunda parte, retornando ao processo temático na última estrofe. Tatit realiza esta formulação em "O Século da Canção".[3]
Garota de Ipanema merece algumas considerações à parte, uma vez que é citada em, pelo menos, três livros do mesmo autor: Canção: eficácia e encanto; O Cancionista e O Século da Canção. É como se esta obra representasse uma síntese da canção popular brasileira. Uma síntese "letrada", tendo em vista que seus compositores foram Tom Jobim - músico e arranjador de sólida formação musical - e Vinícius de Moraes - reconhecido poeta, letrista e até então diplomata. Cabe-nos, então, buscar o que é que a garota tem que a fez tão representativa da canção brasileira.

Além dos elementos constitutivos da canção - duração, freqüência e timbre - e dos processos significativos relacionados ao andamento e ao ritmo, tais como a tematização e passionalização, a teoria de Tatit aborda, também, a relação entre melodia e texto através do conceito de tonema:

Os tonemas são inflexões que finalizam as frases entoativas, definindo o ponto nevrálgico de sua significação. Com apenas três possibilidades físicas de realização (descendência, ascendência ou suspensão), os tonemas oferecem um modelo geral e econômico para a análise figurativa da melodia, a partir das oscilações tensivas da voz. Assim, uma voz que inflete para o grave, distende o esforço da emissão e procura o repouso fisiológico, diretamente associado à terminação asseverativa do conteúdo relatado. Uma voz que busca a freqüência aguda ou sustenta sua altura, mantendo a tenso do esforço fisiológico, surge sempre continuidade (no sentido de prossecução), ou seja, outras frases devem vir em seguida a título de complementação, resposta ou mesmo como prorrogação das incertezas ou das tensões emotivas de toda sorte.[4]

Este conceito (tonema) talvez seja o elo comum entre a enunciação da fala e a enunciação musical da canção - regidas pelos mesmos princípios lingüísticos. Através desta elaboração, Luiz Tatit aborda subliminarmente a existência de uma espécie de melodia da linguagem, onde as curvas melódicas seguiriam o seguinte esquema:


TONEMAS
Descendente V
· Inflexão para o grave
· Distensão do esforço fisiológico
· Asseverativo
· Repouso
· "Ponto Final"
· Resolução/Aproximação

Ascendente ^

· Inflexão para o agudo
· Aumento do esforço fisiológico
· Continuidade
· Prossecução/Tensão
· "Ponto de Interrogação"
· Tensão/Afastamento


Suspensivo ->

· Sustentação da altura
· Manutenção do esforço fisiológico
· Continuidade
· Prossecução/Tensão
· "Ponto de Exclamação"
· Tensão/Afastamento

Torna-se interessante constatarmos que o conceito de tonema desenvolvido pelo autor poderia ser aplicado também à voz falada se analisássemos um poema recitado, um discurso ou a fala de um ator, por exemplo. Isto porque podemos também escutar um código de alturas que está presente na fala: tonema descendente sempre que finalizamos uma idéia comunicativa; tonema ascendente, que gera a tensão necessária para a realização de uma pergunta. Sob o ponto de vista de um músico, toda fala é musical.[5]


Ainda no modelo de Tatit, quando a canção se aproxima da linguagem falada, ocorre o processo de figurativização

entendida como o estreitamento do laço entre fala e canção, ou melhor, a aproximação desta em direção àquela, tem como principal fator o desfecho da frase melódica, ou seja, o tonema.[6]

Existe, então, uma correspondência entre tematização e figurativização, da mesma forma em que se constata a relação direta entre passionalização e modalização. Se a figurativização consiste numa aproximação com a fala cotidiana; a modalização consiste na aproximação com os códigos musicais.

[1] Tatit, Luiz. O Cancionista, p. 9.
[2] Dietrich, Pieter. Araçá Azul: uma análise semiótica, p. 20.
[3] Tatit, Luiz. O Século da Canção. P. 186.
[4] TATIT, Luiz Augusto de Moraes. O Cancionista: composição de canções no Brasil. São Paulo: Edusp, 1996. p. 21.
[5] Verificar o exemplo de Hermeto Pascoal, que transportou para a linguagem musical discursos de celebridades políticas.
[6] Dietrich, Pieter. P. 23

sexta-feira, 18 de julho de 2008

12 de Agosto - O cancionista, de Luiz Tatit.


Próximo encontro do Núcleo de Estudos da Canção: 12 de Agosto, às 18h no Museu da UFRGS.
Tema: O cancionista - composição de canções no Brasil, de Luiz Tatit.
Compareçam devidamente lidos.
Fiquem à vontade para postar suas leituras, comentários, etc.